quinta-feira, 26 de março de 2009

MÚSICA POPULAR DE VANGUARDA

Geralmente associada às artes visuais, a poesia concreta tem longo histórico de associação com a música.

A começar pelo contato direto entre os poetas do Grupo Noigandres (Augusto e Haroldo de Campos e Décio Pignatari) e os músicos de vanguarda atuantes em São Paulo na década de 50 - a saber: os maestros Rogério Duprat, Gilberto Mendes e Julio Medaglia.




Este contato seria fundamental para que se estabelecesse um canal comunicante não apenas entre poesia concreta e música erudita (o maestro Gilberto Mendes era pioneiro na transposição de poemas concretos para o repertório da música eletro-acústica) como também entre poesia concreta e música popular, uma vez que o maestro Rogério Duprat seria, na década de 60, o produtor e arranjador de discos fundamentais de Caetano Veloso e Gilberto Gil, sem falar no disco-manifesto "Tropicalia ou panis et circensis", cuja capa ostenta, entre outros, Duprat segurando um penico (em referência ao artista de vanguarda Marcel Duchamp) no meio de Tom Zé, Caetano, Gil, Gal Costa e Capinan.




É importante destacar que já na década anterior Augusto de Campos havia publicado artigos procurando entender e situar a bossa nova no contexto da evolução das formas musicais modernas.



Na década de 60, o poeta Augusto de Campos seria um dos primeiros a advertir para o potencial estético não apenas dos artistas ligados ao grupo de Caetano e Gil como também de figuras como Jorge Ben, Hermeto Pascoal, Paulinho da Viola, Jards Macalé e Walter Franco.





A somatória dos artigos sobre bossa nova e a música popular brasileira dos anos 60 e 70 foi enfeixada num volume intitulado O balanço da bossa e outras bossas (São Paulo: Perspectiva, 1974).


Este livro é importante não apenas por reunir material crítico de difícil acesso: é uma verdadeira aula sobre as relações entre som e palavra e sobre as vertentes mais interessantes da música erudita do século XX.

Num artigo de 1970, Augusto de Campos reconhecia a existência desse canal comunicante emergente entre certos nomes da música popular brasileira e a vertente mais vanguardista da poesia moderna. A este território livre que se abria a partir do diálogo entre as duas linguagens chamava Augusto de Musica Popular de Vanguarda.

Esta Musica Popular de Vanguarda seria o resultado de uma linha reta que parte na segunda metade do século XX de Lupicínio Rodrigues e João Gilberto, chegando até Jards Macalé, Walter Franco e Novos Baianos, passando obviamente por Caetano e Gil.

domingo, 1 de março de 2009

CONCEITOS OPERACIONAIS: FRAGMENTOS PARA DISCUSSÃO




1. É possível definir o que é literatura e qual é sua função?


2. E para que poetas em tempos de fome?


3. É possível definir exatamente a função da crítica e da interpretação de textos literários?


4. A crítica literária pode ou deve aspirar à totalidade? A totalidade é um horizonte possível no âmbito da crítica literária? E no âmbito da linguagem, do pensamento e do processo de obtenção do conhecimento?


5. A paralaxe é um fenômeno óptico relativamente simples que pode ser usado como método. Ela é a mudança de posição aparente de um objeto em relação a um segundo plano mais distante, quando esse objeto é visto a partir de ângulos diferentes.


6. O Objeto só pode ser percebido quando de lado, sob uma forma parcial, distorcida, como a sua própria sombra – se lhe lançamos um olhar direto nada vemos, vemos um simples vazio. O Objeto só é acessível através de um adiamento incessante. O Objeto é, portanto, qualquer coisa de criado por uma rede de desvios, aproximações e quase colisões.


7. A Coisa Real é um espectro fantasmático cuja presença garante a consistência de nosso edifício simbólico, permitindo-nos evitar sua inconsistência constitutiva.


8. Todas as nossas posições são relativas, condicionadas por constelações históricas contingentes, de forma que ninguém tem soluções definitivas, apenas soluções pragmáticas temporárias.


9. Nos vinte anos em que tenho dado aula de literatura assisti ao trânsito da crítica por impressionismo, historiografia positivista, new criticism americano, estilística, marxismo, fenomenologia, estruturalismo, pós-estruturalismo e agora teorias da recepção. A lista é impressionante e atesta o esforço de atualização e desprovincianização em nossa universidade. Mas é fácil observar que só raramente a passagem de uma escola a outra corresponde, como seria de esperar, ao esgotamento de um projeto; no geral ela se deve ao prestígio americano ou europeu da doutrina seguinte. Resulta a impressão – decepcionante – da mudança sem necessidade interna, e por isso mesmo sem proveito. O gosto pela novidade terminológica e doutrinária prevalece sobre o trabalho de conhecimento.


10. Por mais que cognitivistas e desconstrutivistas – esses inimigos mortais – clamem em acordo que o Eu “substancial” que precede ao campo aberto da interação social contingente, este Eu “substancial” não existe, por mais que o esoterismo new age ocidental faça coro com a narrativa de que o Eu é apenas um conjunto de eventos mentais heterogêneos e elusivos, por mais que eles clamem, nossa experiência cada vez mais é a de um Eu isolado e imerso em sua esfera neurótica ou alucinatória. Eis-nos ligados à rede por nossos computadores que rodam Windows; no entanto, nós somos cada vez mais organismos isolados sem qualquer janela para a realidade, interagindo sozinhos com uma tela de computador, encontrando apenas simulacros virtuais e presos cada vez mais nas tramas da rede ideológica da globalização.


11. A interpretação da arte a partir unicamente da forma, isolada no belo formal, é pobre perante o fenômeno estético, é uma redução.


12. A importância do dado biográfico para a interpretação da obra é relativa. Embora psicanalistas e críticos literários operem interpretações a partir de textos (um, com as narrativas do inconsciente oferecidas pelos pacientes; o outro, com textos literários), como bem frisa Adorno, o elemento biográfico projetivo no processo de produção dos artistas é, na relação com a obra, apenas um momento e dificilmente o decisivo. O mesmo autor chama atenção para o perigo da aplicação da psicanálise à interpretação de obras de arte, uma vez que sua ênfase nas projeções biográficas acaba por reduzir o fenômeno estético à identidade integral entre obra e artista. Para Adorno, a psicanálise corre sempre o risco de transpor o pedantismo médico para um objeto inadequado e sutil – como Leonardo e Baudelaire ou, entre nós, Machado de Assis ou Clarice.


13. A literatura é uma prática especificamente subjetiva? Em que medida ela ajuda a construir a subjetividade de quem lê?


14. A literatura pode ajudar a entender e construir o real? A interpretação e a crítica de textos literários e de fenômenos culturais pode ajudar a entender e construir o real?


15. A literatura é um ato socialmente simbólico. Por isso a prioridade da interpretação política dos textos literários. A perspectiva política não é um método suplementar ou auxiliar opcional de outros métodos interpretativos hoje em uso – o psicanalítico, o mítico-crítico, o estilístico, o ético, o estrutural –, mas como horizonte absoluto de toda leitura e de toda interpretação.


16. Em plena vigência das sociedades midiáticas e em plena vitória do capitalismo multinacional com discurso e dominação globalizantes, ainda é possível falar em cultura popular? Confrontar as suas reflexões com as de Roberto Schwarz: Como seria a cultura popular se fosse possível preservá-la do comércio e, sobretudo, da comunicação de massa? O que seria uma economia nacional sem mistura? De 64 para cá a internacionalização do capital, a mercantilização das relações sociais e a presença da mídia avançaram tanto que estas questões perderam a verossimilhança.

EMENTA


LITERATURA BRASILEIRA VI (Código: GLC00208)



Objetivos da Disciplina:

Propor uma reflexão sobre a cultura brasileira, focalizando-a a partir das articulações entre literatura e outras artes, tais como o teatro, o cinema, as artes plásticas / Discutir as relações contemporâneas entre cultura e indústria cultural, destacando-se as inter-relações entre literatura e mídia / Oferecer um repertório teórico composto de conceitos operacionais básicos para a leitura crítica de textos/ Levar o aluno a uma prática de leitura e interpretação de textos com vistas à formação do futuro docente.

Descrição da Ementa:

O curso propõe uma leitura, ao mesmo tempo sincrônica e diacrônica, da cultura brasileira pelo viés de sua literatura, aqui considerada em suas articulações com o teatro, o cinema, as artes plásticas e a mídia / Relação entre panorama nacional (local) e situação internacional (universal), sob enfoque comparativo.